quinta-feira, 11 de julho de 2013

Santo Padre Francisco em Lampedusa




Francisco foi visitar a porta pela qual entram no suposto paraíso europeu centenas de migrantes árabes e subsaarianos. Foi para ver a porta da esperança que, para alguns, se converte em sepultura. Foi para ver Lampedusa, a ilha que acolhe os ‘indocumentados’ em busca de uma vida digna. Foi apalpar com as próprias mãos e ver com seus próprios olhos o pranto dos esquecidos, reclusos durante meses e anos em uma ilha italiana. Com o paraíso ao alcance da mão, mas sem poder tocá-lo.
Uma visita aos últimos, seus preferidos. Uma viagem curta, mas carregada de mensagens e de símbolos. Uma visita para sacudir a consciência das autoridades europeias que mantêm em funcionamento os CIES (Centros de Internamento para Estrangeiros), autênticas prisões para imigrantes e refugiados.
Francisco foi para Lampedusa para chorar pelos mortos. Para chorar pelos quais ninguém chora. E em sua honra, mandou parar o barco que o levava ao cais de Cala Pisana, para lançar ao mar uma coroa de flores. Uma coroa por todos os mortos em todos os “estreitos” do Mediterrâneo, em todas as fronteiras eletrificadas, como a dos Estados Unidos, e em todos os muros, como o de Israel.
Oração pelos mortos e abraços nos vivos “estacionados” na ilha. Já no cais quis que os primeiros a saudá-lo fossem os imigrantes. Ali, um deles, tremendo de emoção, a duras penas conseguiu ler uma breve saudação em árabe, que, a duras penas também, outro companheiro ia traduzindo para o italiano.
Uma saudação em forma de SOS: “Ajude-nos, Santo Padre. Sofremos e fomos sequestrados por diversos traficantes. Sofremos tanto para chegar aqui... Pedimos a ajuda do Santo Padre. Agradecemos a Deus por sua ajuda. Queríamos que outros países europeus nos acolhessem”.
Símbolos de restos de barcos
E o Papa recolhe a folha de papel do rapaz árabe e a guarda. Como uma relíquia. Por ele e por seus companheiros, os vivos e os mortos, veio a Lampedusa para tornar visível sua situação. Para que ninguém, a partir de agora (especialmente nos escritórios europeus) feche os olhos diante deste drama.
Um drama que Francisco denunciou com palavras e símbolos. Entre estes últimos, o cálice de madeira ou o ambão, feitos de restos de barcos, e um velho timão. Mas o que mais me chamou a atenção foi o báculo e o altar usados na missa. Nunca antes havíamos visto um Papa com um báculo feito com a madeira de embarcações naufragadas. O mais parecido, o báculo de madeira de dom Casaldáliga, o bispo dos índios brasileiros.
Um báculo de madeira de embarcação e uma barca como altar. Com esses símbolos, Francisco quis agradecer o “dom da caridade” dos lampedusanos. Mas também aproveitou para pedir perdão “pela globalização da indiferença”. Porque na Europa já não há lugar para o pranto nem a compaixão. Porque se secaram os nossos corações diante do sofrimento de nossos irmãos.
Porque já não respondemos à pergunta de Deus a Caim: “Onde está o teu irmão?”. E, quando queremos responder, lavamos as mãos, com o clássico: “a culpa não é de ninguém, porque é de todos”. Como em Fuenteovejuna, a comédia de Lope [Felix Lope de Vega (1562-1635), dramaturgo e poeta espanhol] que o Papa citou expressamente.
E concluiu reiterando, de novo o perdão “por aqueles que com suas decisões em nível mundial criaram situações que levam a estes dramas. Perdão, Senhor!”.
E voltou para Roma, com o coração encolhido pelo pranto dos esquecidos e o báculo feito com a madeira de embarcações que naufragaram. Bendito báculo de Francisco, esperança dos que buscam uma vida digna!


Nenhum comentário:

Postar um comentário